23.2.08

Visão diferente sobre avaliação de professores

No troca de informação que se verifica na blogosfera, pedi a uma pessoa exterior à Escola que me desse a sua opinião sobre a avalição de desempenho dos professores. O texto que se segue, despretencioso mas sério, aqui fica para reflexão.
  • Tal como qualquer outra pessoa, um professor tem que ser avaliado. Mas, tal como qualquer outra pessoa, tem direito a ser avaliado com base em critérios objectivos. E não creio que qualquer avaliação tenha conseguido estabelecer esses critérios (nem a antiga, nem a actual), seja para professores ou para qualquer outra classe profissional.
    No entanto, e não foi assim há tanto tempo que deixei de ser aluna, (aliás, estou a dias de defender uma tese de mestrado, por isso continuo aluna) também sei que há professores que têm vocação para tudo menos para professores. Tive exemplos desses ao longo de toda a minha vida, principalmente nas áreas das ciências exactas.
    Passando este ponto, posso dizer-lhe que a classe dos professores está, neste momento, sob uma imensa pressão, vinda tanto do Ministério, como dos próprios pais e alunos. E essa pressão, quanto a mim, deve-se, em larguíssima medida, ao facto de, durante anos, terem sido uma classe de "intocáveis", onde a progressão era um faz-de-conta, com pseudo-relatórios e pseudo-formações pedagógicas. Além disso, e talvez devido à tal crise de vocações de que já lhe falei, os maus professores (sem vocação, nem capacidade pedagógica) suplantaram em número e em protagonismo os bons professores. E todos sabemos que se costuma generalizar com o mau e considerar o bom como a excepção à regra. Acho, em resumo, que foi este quadro que acabei de descrever que levou à situação actual. A confusão tinha de acabar. Os professores com horário zero tinham que acabar, os professores de gabinete (em comissões de serviço eternas, requisições para outras funções, etc) tinham de acabar. Atenção, que eu sei que o que acabei de dizer para os professores também existe quanto a todas as outras profissões que podemos incluir no conceito global de "função pública".
    Agora, o modo como a ministra, perdão, o governo, resolveu fazê-lo é que também não me parece o melhor.
    Primeiro, era preciso explicar o porquê da necessidade de ter um melhor ensino. E que essa melhoria passa, necessariamente, por melhores professores. Por pessoas que escolham ser professores porque é essa a sua vocação, o seu desejo e porque, e isto também é importantíssimo, têm capacidades pedagógicas e de transmissão de conhecimentos (capacidade de expressão) acima da média. Não se pode dizer, simplesmente, que isso acabará por aparecer.
    Dou-lhe o meu exemplo: eu tenho perfeita noção que não consigo explicar nada aos outros. Aquilo que eu percebo acho tão simples que não compreendo como os outros também não o acham simples. E o que não percebo, obviamente, não sou capaz de explicar.
    Voltando ao assunto, concordo que é verdade que não há vocação que resista quando não existem condições físicas e psicológicas (melhores equipamentos escolares e regras mais rigorosas para os meninos, que isto agora é uma bandalheira), quando não há o apoio da comunidade.
    E era por aí que se tinha de começar: sensibilizar toda a gente para a necessidade da mudança, para a necessidade de exigência no ensino, e a partir daí estabelecer níveis de exigência tanto para os professores como para os alunos [e não, volto a frisar, a bandalheira que existe agora, em que os meninos coitadinhos são uns pobrezinhos (vão ficar traumatizados!) que não podem ser chumbados sem que os professores sejam crucificados!].
    Tenho acompanhado o percurso de duas primas que são professoras.
    Uma já dá aulas há muitos anos e concorda comigo. Como estava antes, não podia ser porque não havia qualquer grau de exigência e de rigor dentro da própria classe, levando a poder atirar-se isso mesmo à cara dos professores sempre que houvesse qualquer tipo de reivindicações.
    A outra começou este ano a dar aulas como professora de biologia (do 3.º ciclo, como agora se diz, 7.º a 9.º anos) num colégio particular, com um horário mínimo, recebendo cerca de 400€ por mês. Apanhou a reforma do ensino, com a obrigatoriedade do estágio como integrante do curso e por isso sem retribuição nem contabilização daquele ano em termos de carreira. Passou pelo processo de concurso, ficou cá bem no fundo e está, concerteza, condenada a nunca ser colocada numa escola oficial... Vê-se em situações verdadeiramente surreais quando quer dar uma nota negativa a um aluno e atura coisas de miúdos de 13 e 14 anos que mereciam uma boa palmada e nem os pode mandar para a rua...
    Em suma, como estava não podia ficar, mas como está também é insustentável.
    Avaliação? Sim, como critérios objectivos, com ponderação, tendo em conta não só as suas capacidades como professores tout court, mas também as suas capacidades pedagógicas e o meio onde estão. Os professores que dão aulas em escolas problemáticas têm que ter critérios diferentes dos que estão colocados em escolas boas ou medianas. Os seus esforços são, necessariamente, diferentes.
    Avaliação dos alunos em critérios diferentes dos que existem agora? Absolutamente de acordo. As crianças dos nosso país não podem achar que mesmo que não percebam nada daquilo, acabarão por passar e as dificuldades que tenham serão suprimidas de algum modo... A não ser que vivam no País das Maravilhas...

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5 Comments:

Anonymous Anónimo said...

gostava de saber como é que a autora do texto chegou à conclusão de que o número de professores incompetentes supera o dos competentes. Cálculo a olho?...

23/2/08  
Anonymous Anónimo said...

Na verdade, sempre considerei a avaliação algo necessário na medida em que sempre a pensei como em algo regulador do meu trabalho, que me pudesse "dizer" do bem e mal que é o meu ensino e uma vez que se trata de uma profissão solitária, isolada, nosso, de nós, em nós e para nós.

Os motivos afinal são outros, válidos para quem vai lucrar com eles nas reformas que não vai dar, nas progressões que não vão existir.


E tudo vai mal no reino da Dinamarca...

eu

24/2/08  
Anonymous Anónimo said...

Caro "toino do campo":
como deixei bem claro, é uma posição pessoal,que me foi pedida como tal, logo, baseada nas vivências que tive.
Lamento informar de que tive péssimos professores, que se davam ao luxo de avisar (logo à partida e para não haver dúvidas) que estavam ali a dar aulas porque não conseguiram emprego em mais lado nenhum.
E também tive excelentes professores que não se importavam de perder horas e horas da sua vida pessoal para apoiar os seus alunos em projectos de toda a espécie (no meu tempo de escola obrigatória não havia essa novidade de projectos área-escola, portanto, todo e qualquer projecto fora do horário ficava por conta e risco dos alunos que se empenhavam e dos professores que acreditavam em nós).
E o que acabei de dizer aplica-se aos professores da faculdade onde andei (pertencente à Universidade de Lisboa) e a alguns dos senhores professores doutores que me deram aulas de mestrado.
Basicamente, sim, foi cálculo a olho. Que pode estar mal feito porque, azar dos azares, a imensa maioria dos maus professores que tive leccionava matemática...
se tem uma perspectiva/opinião diferente, creio que ninguém lhe restringirá o direito a expressá-la. Mas, já agora, se o fizer, explique antes a fórmula que aplicou para não ser também o seu um "cálculo a olho".
Ps: vitor, lamento estar a usar a caixa dos comentários para dar uma resposta pessoal, que em nada contribui para a discussão que queria promover, mas embirro solenemente com quem só sabe ver um lado da questão...

25/2/08  
Blogger Vítor Amado said...

Angela:só hoje vi o teu comentário. A diversidade de opinião é lema deste blog. Por isso,devemos encarar a divergência como enriquecedora. Não me arrependo em nada por ter publicado o teu texto.Obrigado.

27/2/08  
Blogger Ângela said...

Uma sugestão: o blogue do Prof. Adelino Maltez "sobre o tempo q passa" (a ligação está no meu blogue).
Tem lá uns textos interessante sobre os professores.

28/2/08  

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